sábado, 2 de novembro de 2013

Leituras equivocadas e mal interpretadas.


A comunicação é uma das tarefas mais difíceis nas relações amorosas. De modo geral, os relacionamentos envolvem sempre projeções, distorções, racionalizações, falas, escutas e leituras equivocadas e mal interpretadas. É comum falarem que falamos o que não falamos, falar que fizemos o que nunca fizemos e, não raro também, podemos ouvir o que não falaram e ver o que nunca na realidade existiu... Isso porque não ouvimos com os ouvidos, não vemos nem percebemos com os olhos e não nos comunicamos apenas através das expressões verbais. Lemos e interpretamos os fatos, a fala, o olhar e o comportamento do outro, a partir das lentes de nossas memórias, feridas e recalcamentos: somos intérpretes da vida. Pois “não vemos as situações e a realidade como, de fato, elas são, mas como nós somos”. 

Existe uma multiplicidade de fatores que determinam o nível e a saúde na comunicação entre o casal, que vão desde os repertórios psíquicos herdados por cada um dos membros do par conjugal até a maneira particular como homens e mulheres fazem uso das palavras, interagem e comunicam-se entre si. 

Como já foi dito anteriormente, homens e mulheres se estruturam de modo distinto um do outro, o que reflete na maneira de ambos utilizarem as palavras. Muito frequentemente, as mulheres fazem uso de licença poética na utilização das palavras. Elas também as utilizam para descrever sentimentos e emoções. Os homens, por sua vez, as utilizam para descrever ideias e pensamentos.

É muito comum as mulheres dizerem: “Você está sempre atrasado”, ou “Você nunca faz o que eu te peço”, ou ainda, “Você nunca me leva para jantar”. Costumo afirmar que, para uma mulher, a palavra nunca, quase nunca ou nunca significa nunca. Ao fazer uso desse vocábulo, ela está se comunicando a partir de uma carga emocional que lhe atribui um sentido diferente do utilizado, frequentemente, pelo universo linguístico masculino. Na realidade, ela não está querendo dizer que de fato isto nunca acontece, mas que desejaria sair com o parceiro com mais frequência, ou que sente a sua falta.

Essa maneira de se comunicar, na maioria das vezes, provoca muitos desentendimentos, na medida em que o parceiro se sente injustiçado e desestimulado por nunca - falo como homem!- conseguir satisfazer as exigências de sua parceira. 

É muito comum também ouvir: “Não dá para conversar com o meu marido, ele sempre deturpa tudo o que eu digo”. Para Lacan, homens e mulheres falam línguas diferentes, por isso não se escutam, trata-se de dois sujeitos que não se entendem, o que faz com a relação entre ambos seja marcada por um mal-entendido crônico. Tal fato pode explicar a razão de muitos casais, na intenção de se aproximarem e resolverem o conflito através do diálogo, encontram-se ainda mais distantes depois de tentarem se ajustar. Em minha experiência clínica, em muitos casos, intervenho na intenção de evitar, temporariamente, que os casais discutam a relação até que tenham mais recursos internos para se comunicarem de forma mais sadia. No próximo capítulo, daremos algumas dicas sobre como nos comunicar de forma mais apropriada com o nosso parceiro.
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Luciano Vilaça (extraído do livro Companheiros Inseparáveis)